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Larissa Louback

Caso Marcia Barbosa de Souza versus Brasil

No dia 07 de setembro de 2022, a Corte Interamericana de Direitos Humanos julgou o caso Márcia Barbosa versus Brasil, cujo objeto era a prática de homicídio praticada pelo então deputado da Paraíba Aércio Pereira Lima contra Márcia Barbosa, de apenas 20 anos, em 1997.


Márcia representa uma parcela massacrada pela sociedade brasileira: mulher, negra e periférica.


O caso foi adiado por várias vezes na justiça brasileira. Quando finalmente foi julgado em setembro de 2007, o Tribunal Júri condenou Aércio a 16 anos de prisão. Aércio recorreu da sentença e em 2008 faleceu.


Em que pese constatarem-se o envolvimento de outros agentes no crime, ninguém foi responsabilizado.


A Corte Interamericana enviou inúmeras recomendações ao Brasil para que efetivasse políticas protetivas à mulher. Mas nada foi feito.


"Esta decisão se apresenta paradigmática em diversos aspectos. Foi a primeira condenação da corte ao estado brasileiro concernente integralmente à temática de violência contra a mulher. A corte reconheceu que a violência contra as mulheres no Brasil era e continua sendo um problema estrutural e generalizado, concluindo que altos níveis de tolerância a esse tipo de violência estão normalmente associados a altas taxas de feminicídio. A corte evidenciou, ainda, que o emprego da imunidade parlamentar, sem qualquer indicação da presença de elementos de arbitrariedade no exercício da ação penal, de modo a comprometer a autonomia do legislador, é flagrantemente arbitrária e contribuiu sobremaneira para a impunidade verificada no caso. Ainda, destacou a falta de investigação e processamento do caso com parâmetros de gênero, o que se mostrou evidente na condução das diligências investigativas, com ênfase nos questionamentos sobre o comportamento e a sexualidade de Márcia. A direção de estereótipos de gênero e preconceitos pessoais dos investigadores influíram, para a corte, em suas conclusões profissionais sobre o que se havia praticado contra a vítima dos crimes, pondo em dúvida a própria credibilidade de Márcia nessa condição. Essas circunstâncias ficaram evidentes também, no entender da corte, na falta da devida diligência pelo Estado em empreender esforços para a identificação e o processamento de todos os envolvidos nos crimes.

Ao final da decisão, a corte estabeleceu diversas medidas de reparação integral, agrupadas em três níveis:


1) Como medidas de satisfação:

1.1) a publicação e a difusão da sentença e de seu resumo oficial; e

1.2) a realização de um ato de reconhecimento de responsabilidade internacional;


2) Como garantias de não repetição:

2.1) a implementação de um sistema nacional de dados sobre violência contra as mulheres, que permita análises qualitativas e quantitativas;

2.2) a prática de formação continuada das forças policiais paraibanas com perspectiva de gênero e raça;

2.3) a realização de uma jornada de reflexão e sensibilização na Assembleia Legislativa da Paraíba sobre o impacto do feminicídio e da violência contra a mulher, e sobre a imunidade parlamentar; e

2.4) a adoção e implementação de um protocolo nacional para a investigação de feminicídios;

3) Como medidas de compensação, o pagamento dos valores de indenização por danos materiais e morais à família de Márcia Barbosa de Souza.

É precoce a avaliação sobre os impactos que as medidas de reparação impostas deverão produzir na prevenção e repressão à violência contra a mulher no país, mormente no que diz respeito aos feminicídios. Nada obstante, doutrinadores como Engstrom, Calabria, Tramontana discutem e demonstram a eficácia de decisões proferidas no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, refutando as avaliações de impacto que se restringem ao cumprimento estrito das manifestações da Comissão e Corte Interamericanas.

Não se pode ignorar que as decisões proferidas nesse caso e em outros que tramitaram perante a comissão e a corte refletiram em relevantes transformações sociais, notadamente no fortalecimento do sistema de enfrentamento à violência contra a mulher. Isoladamente, no entanto, não se prestam a revoluções. Restam ao Estado, às instituições e à sociedade civil trabalharem harmonicamente na direção da concretização e defesa dos direitos humanos no país."


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