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  • Walmir de Albuquerque Barbosa

Crônicas do cotidiano: As Forças Ocultas e o Sol do Meio Dia

O Cartunista Paulo Caruso, que nos deixou na semana passada, dizia que o Estado Brasileiro era o maior fornecedor de matéria-prima para o humor. Assim sendo, este poderia até ser “estatizado”. Tinha razão em sua sapiência de jornalista opinativo, revelada através de sua arte gráfica e do humor refinado. Como jornalistas, temos, é certo, os fatos como matéria-prima do nosso trabalho. Como eles se nos apresentam é o que nos obriga a investigar o grau de complexidade de cada um. Às vezes se apresentam, apenas, como espuma sobre a superfície e, em outras, espumas com raízes profundas, que tocam as estruturas da sociedade. Sobre nosso Brasil vemos um mar de espumas, neste momento: escândalos envolvendo “ex” e atuais ministros acusados de desvios éticos; a associação dos procuradores federais querendo, sozinha, indicar o nome da mais alta autoridade do Ministério Público, dono de vida ou morte da Ação Penal Pública, que pode levar ou não os poderosos às barras dos tribunais; o escândalo das joias presenteadas ao Ex-Presidente e à sua Esposa, de marcas reluzentes e com suspeitas de “maracutaia”; crime de “trabalho análogo à escravidão” de que estão sendo denunciadas as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi, que fazem dancinha com colonos brancos e de olhos azuis para receber turistas no “Circuito da Serra Gaúcha”, mas foram flagradas usando mão de obra de trabalhadores nordestinos de uma terceirizada e fazendo de conta que apenas usufruíam das facilidades da Reforma Trabalhista, que flexibilizou as relações de trabalho até ao ponto de precarização escravista, com rótulo de modernidade; a briga farsesca entre os interessados e descontentes com a Reforma Tributária; a decisão do Conselho da PETROBRAS, indicado pelo governo anterior, que fez da empresa de economia mista, a segunda maior distribuidora de dividendos do mundo, para os acionistas, enquanto donos de postos de combustíveis aceleram os preços nas máquinas de abastecimento; o Banco Central, evocando sua autonomia, à revelia de todas as teorias econômicas sensatas, da opinião de banqueiros e até de um Prêmio Nobel de Economia, continua sentado numa montanha de 13,75% de Juros, velando pela política econômica do Guedes, derrotada nas urnas, nas eleições para a Presidência da República; e a vergonha nacional dos altos índices de feminicídio, sem que o Estado possa prover as garantias constitucionais das mulheres fortalecendo o aparato preventivo e repressivo. Tudo pode virar meme na internet e atração na mídia tradicional, em pleno sol de meio dia, sem que nada ou muito pouco se possa fazer para mudar o rumo das coisas e da prosa. O meme pode até nos fazer sorrir, mas as consequências dos fatos a que se refere são fatais para a nação, para o povo e, sobretudo, para os mais necessitados e injustiçados. Já as forças ocultas continuam a ocupar papel importante na trajetória da nação, mesmo sabendo-se onde moram, o que andam aprontando e quem são seus incumbentes. Getúlio Vargas as mencionou na sua Carta Testamento (1954), Jânio Quadros (1961) as colocou no palco de sua renúncia à Presidência da República e o Golpe de Estado de 1964 as consagrou. Apareceram como farsa atrapalhando a posse de Sarney (1985) e no impeachment de Collor (1992). Reapareceram no governo Dilma até derrubá-lo (2016). Agora, rondam quartéis, achacam a mídia, convidando membros de seus quadros a se tornarem ventríloquos de seus desejos; instrumentalizam os púlpitos e tentam infiltrar-se no sistema educacional. Basta falar em “taxar grandes fortunas”, “aumentar a taxa sobre herança” ou criar instrumentos de Estado para combater a “sonegação” e a “corrupção”, próprias do patrimonialismo, que elas entram em ação. Seu ecossistema nutre o Estado Mínimo, que se recusa a gastar com pobre, com políticas públicas relevantes e dispensa o corpo de servidores com prerrogativas de estabilidade. Tudo com o fito de impedir que venha à luz do dia a lama que se esconde sob a espuma que produzem com habilidade. Tais forças ocultas, pagam a peso de ouro e diamantes os seus acólitos, com o objetivo de retardar a emancipação das desigualdades e deixar tudo como sempre foi: a vanguarda do atraso!


Autor: Dr. Walmir de Albuquerque Barbosa

Jornalista Profissional.

Professor Emérito e ex-reitor da Universidade Federal do Amazonas. Manaus (AM), 10/03/2023. *Toda sexta-feira publica no site EPCC suas Crônicas do cotidiano. Confira na obra "Trajetórias culturais e arranjos midiáticos" (2021) seu capítulo "Comunicação, Cultura e Informação: um certo curso de jornalismo e vozes caladas na Amazônia".

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