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  • Walmir de Albuquerque Barbosa

Crônicas do cotidiano: “Como Fênix, das cinzas”

No Rio Grande do Sul, no início da semana, o proprietário, o gerente e seguranças, com uma ripa de madeira, um martelo, chutes, socos e pontapés, torturaram um homem indefeso, nos fundos de um supermercado, pessoa acusada de furtar uma “picanha bovina”. A cena é forte e triste, pela crueldade, pela falta de caráter, pela desumanidade e pela falta de vergonha de um grupo de pessoas que resolveu, simplesmente, mostrar a cara, os seus instintos mais sórdidos, desafiando as leis, os princípios de respeito à dignidade humana, desconhecendo o outro como seu semelhante. O outro, é o outro, o inimigo. Não importa se está com fome, se nunca lhe foi dado o direito às oportunidades que permitiriam uma vida plena e digna, ou, ainda, resultado dos fracassos da vida ou das políticas públicas do Estado. Isso é parte intrínseca da maldade Humana? Não! Isso se deve a acidentes pontuais numa sociedade desigual? Em parte, sim! Deve-se à ação demoníaca que perverte o espírito dos tementes a Deus? Não! São coisas que colocaram na cabeça de pessoas que aceitaram a crueldade como parte de sua ideologia discriminatória. Quando um patrão ameaça ou demite funcionários porque discordam de sua convicção político-partidária; quando exige que os filhos dos empregados, por receberem “Auxílio Brasil”, participem dos eventos de suas facções, sob pena de demitir os seus pais; quando, nos grupos de condomínio, “cancelam-se” pessoas por discriminação ideológica; quando pais e mães instruem seus filhos, inocentes úteis, para achacar os coleguinhas, que imitando os adultos, seus pais, manifestam-se politicamente contrários a eles, não estamos mais ao acaso; quando ídolos da seleção de futebol comem bifes com folhas de ouro e um homem é torturado num supermercado pelo furto de uma picanha, estamos, sim, num país de fanáticos, torturadores, terroristas e adoecidos que se deixaram contaminar pela força ideológica das maldades contidas nas “teorias conspiratórias”, nas teologias “antissatanistas ” e na sem-vergonhice dos espertos, que não querem perder privilégios e passam a espalhar, difundir, orquestrar e manipular pessoas com o propósito de fazer ou alimentar adeptos. Não são somente atos de desonestidade, são atos políticos! Simplesmente, tortura! E não existe distinção para a tortura, física e/ou psicológica praticada nas polícias, nos quartéis ou nos fundos de lojas. Tortura é crime, ponto!


O Brasil está doente! A minoria privilegiada só pensa em economia, como se a saúde do corpo e da mente de um povo não seja a alma de seu desenvolvimento material e espiritual. É preciso que se leve a sério esse culto à violência e se estude esse adoecimento; suas raízes estão nas “raízes do conservadorismo brasileiro” e viraram ideologia extremista nesses últimos tempos. Não podemos nos contentar somente com as denúncias da imprensa ou do humor do TikTok, que servem para alertar sobre os fatos, mas não são suficientes para diagnosticá-los e propor alternativas. Há muitos gurus intelectuais ocultos dessa violência, além dos “Olavos de Carvalho”: pastores evangélicos, que fazem pregações raivosas e perigosas; religiosos católicos, que escondem seu instinto “Torquemada” sob vestes de cordeiro; financistas, industriais e comerciantes de peso, que surrupiam as migalhas que o Estado oferece aos pobres, nos juros do “consignado”. Todos são responsáveis pelos horrores que precisam ser investigados com urgência, porque estão expostos à luz do dia: as elites assumindo a sua cara fascista em público, desafiando as instituições do Estado Democrático de Direito; numeroso contingente de desvalidos, desempregados, desalentados e “pobres de espírito”, ávidos por um salvador, formando um lúmpen à disposição dos manipuladores de consciências e de opinião, que agem em nome de falsos líderes; e uma casta de tecnocratas bem treinados, armados de múltiplas ferramentas, com avidez, desmontando as instituições públicas e de sustentação do Estado, que levaram quarenta anos para serem construídas. E alguém de perto me lembra, antes do ponto final: Juscelino Kubitschek pensava fazer cinquenta anos de desenvolvimento em cinco; os que dirigem o país, hoje, demoliram em quatro anos o que construímos em quarenta anos de luta, desde o fim da Ditadura.


Autor: Dr. Walmir de Albuquerque Barbosa Jornalista Profissional. Professor Emérito e ex-reitor da Universidade Federal do Amazonas. Manaus (AM), 09/12/2022. *Toda sexta-feira publica no site EPCC suas Crônicas do cotidiano. Confira na obra "Trajetórias culturais e arranjos midiáticos" (2021) seu capítulo "Comunicação, Cultura e Informação: um certo curso de jornalismo e vozes caladas na Amazônia".

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