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Walmir de Albuquerque Barbosa

Crônicas do cotidiano: “Não tenho ouvidos para ouvir estrelas, mas espanto-me”

Domingo passado fui ao Teatro Amazonas (a nossa casa de ópera, em Manaus) para assistir o espetáculo “Encontro Anual de Tenores”, que se realiza há mais de dez anos, com atrações nacionais e internacionais. Tanto a nossa Orquestra Filarmônica quanto os tenores convidados deram o melhor de si. Findo o Espetáculo, acenderam-se as luzes e o público apressou-se em deixar a plateia para ir “tietar” os artistas no hall do teatro e fazer a glória no Twitter. Enquanto esperava a minha vez para deixar a frisa, passou por mim uma senhora embrulhada na Bandeira Nacional, presa ao pescoço e quase se arrastando no chão; e aquilo chamou-me a atenção. Era uma senhora aparentando meia idade, o que não serve de motivo para usar ou não a Bandeira do Brasil, mas indica que tem idade suficiente para saber o que faz. Deparei-me novamente com a dita senhora já na saída do Teatro e tive a leve impressão de que a cúpula do nosso Teatro Amazonas, por algum motivo, estava sendo homenageada. Os que conhecem o Teatro ou o contemplam por fotografia, sabem que sua imensa cúpula traz as cores da bandeira em telhas de escamas de louça e o losango destacado, em amarelo, ao longe, para não deixar dúvidas, indicando que é uma homenagem à República, sua contemporânea nascente. A Ópera fica encimada no alto do Largo de São Sebastião, Manaus, e ao lado dela, rés ao chão, na ala direita do casario tombado circundando o largo, ainda existe a fachada do Antigo Clube Republicano do Amazonas, que ali pensou não só a República no Norte do Brasil em pleno Império, mas, também, agregou as forças civis e militares que aderiram à proclamação; que tramaram e alcançaram a Conquista do Acre; que criaram a Primeira Universidade Brasileira – Universidade Livre de Manaus (1909); e, certamente, consolidaram o poder das armas da República nos governos locais, via escaramuças militares delirantes. Descendo as escadarias, lembrei-me de olhar para o céu, sem esquecer dos degraus, à procura da mais brilhante estrela dos céus brasileiros, ao Norte do País, certamente contemplada por aqueles Republicanos que orbitaram o Largo de São Sebastião: a Prócion, da Constelação do Cão Menor, que representa o Estado do Amazonas no lábaro estrelado de nossa bandeira e como diz a lei que a instituiu e disciplinou seu uso, vista “por um observador situado fora da esfera celeste” às 8 horas e 30 minutos do dia 15 de novembro de 1889, a partir do firmamento da cidade do Rio de Janeiro, então Capital da República Proclamada. Considerando-me legalmente um “ET” (extraterrestre), penso ter “matado a charada”: aquela senhora veio diretamente da manifestação dos chamados “patriotas”, que aos pés dos muros do Comando Militar da Amazônia (CMA), por não aceitarem o resultado da eleição, ainda clamam por “Intervenção Federal”, para assistir ao espetáculo e, no mínimo, provocar “inusitados sentimentos” na plateia.


Não sendo versado em astronomia nem astrologia e muito menos em assuntos militares, recorri aos sábios e descobri duas coisas que fazem sentido: as figuras mais destacadas das forças militares do final do século XIX e das duas primeiras décadas do século XX, eram mandadas para a Amazônia como punição à sua rebeldia, depois é outra história, basta consultar a listas dos Comandantes do CMA e saberá quem são e com o que e com quem se envolveram; com os astrólogos, aprendi que a Prócion, com o seu “brilho forte, mas que muitas vezes pode ser passageiro”, influencia o destino dos que estão sob sua trajetória e os encoraja, nos momentos de brilho intenso, a assumir o protagonismo na história, propondo alternativas. Que seja, neste momento luminoso, que o mundo inteiro, fora da esfera estelar nos contempla, a hora da Nossa Estrela e a aurora de um novo tempo para a Amazônia!

Autor: Dr. Walmir de Albuquerque Barbosa Jornalista Profissional. Professor Emérito e ex-reitor da Universidade Federal do Amazonas. Manaus (AM), 18/11/2022. *Toda sexta-feira publica no site EPCC suas Crônicas do cotidiano. Confira na obra "Trajetórias culturais e arranjos midiáticos" (2021) seu capítulo "Comunicação, Cultura e Informação: um certo curso de jornalismo e vozes caladas na Amazônia".



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